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Educação integral deve ser acompanhada de ensino de qualidade e estrutura: ‘Vetor de transformação’

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Diferente do que pode parecer a princípio, a educação integral não se resume a mais horas na escola. A jornada maior na instituição deve ser acompanhada por um ensino de melhor qualidade, incluindo currículo diferenciado, melhor estrutura física, planejamento e integração com políticas públicas intersetoriais. O conceito foi defendido por especialistas que participaram do meet point “Educação integral: muito além de só mais horas na escola”, promovido pelo Estadão, nesta quarta-feira, 24.

Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), esclarece que o tempo é um potencializador, mas não um definidor da educação integral, que pressupõe um olhar para o ser humano em suas múltiplas funções, conforme assegura a Constituição. “Nós vamos olhar os alunos e alunas não apenas como seres cognitivos, mas que também têm dimensões culturais, sociais, afetivas, relacionais, que são importantes e precisam também ser objeto de trabalho para que eles possam se desenvolver”, afirma.

Da esquerda para a direita: Renata Cafardo, Anna Helena Altenfelder, Patrícia Mota Guedes e Rafael Mattar Machiaverni.
Da esquerda para a direita: Renata Cafardo, Anna Helena Altenfelder, Patrícia Mota Guedes e Rafael Mattar Machiaverni.

Mediado por Renata Cafardo, repórter especial e colunista do Estadão, o meet point contou também com a participação de Patrícia Mota Guedes, superintendente do Itaú Social/Fundação Itaú, e Rafael Mattar Machiaverni, diretor-geral do Parceiros da Educação.

Para Guedes, o ensino integral não deve se reduzir à instituição escolar, rompendo os muros da escola para que os alunos usufruam das estruturas culturais ou esportivas de sua localidade. “O movimento é fundamental. A arte, a música e a fruição, já têm muitos estudos de ciências da aprendizagem que as relacionam profundamente com a capacidade cognitiva”, defende a superintendente do Itaú Social/Fundação Itaú.

Um dos casos de sucesso foi criado no Ginásio Pernambucano, instituição estadual de ensino médio do Recife, e adaptado para diversos Estados brasileiros, como em São Paulo, em 2012, cita Machiaverni. Na iniciativa, alunos trabalham com projetos de vida e de convivência, incluindo clubes juvenis de estudo com assuntos que vão de Matemática a RPG, além de terem um tutor a quem recorrer durante as práticas.

“Isso tudo transforma a escola em algo mais significativo para o aluno. E prepara para as habilidades do século XXI, para a formação sócio-profissional”, afirma o diretor-geral do Parceiros da Educação. Machiaverni defende uma maior compatibilização entre o ensino técnico e escola integral, parcerias com empresas e o fortalecimento de políticas públicas para jovens que precisam de renda para permanecer na escola. Uma das sugestões é que o programa Pé-de-Meia integre um incentivo para estudantes permanecerem no ensino integral.

Para Anna Helena Altenfelder, tempo é um potencializador, mas não um definidor da educação integral
Para Anna Helena Altenfelder, tempo é um potencializador, mas não um definidor da educação integral

Benefícios do modelo

O Brasil tem hoje cerca de 20% dos seus alunos em escolas de tempo integral, no ensino fundamental e no médio. E a expectativa dos especialistas é de que a modalidade chegue próximo de 100% dos estudantes do País, a exemplo do que acontece em nações desenvolvidas. Entre as vantagens do modelo estão permanência e melhora no desempenho educacional, mas também acesso a melhores salários e redução da violência.

Em São Paulo, um modelo de sucesso demonstrou queda de 10 pontos porcentuais na evasão no ensino médio. Pesquisas indicam que alunos em ensino integral ganham R$ 265 por mês a mais do que em ensino parcial e vinculam o modelo à redução de homicídios de jovens negros.

“Em Matemática, os alunos de educação integral aprendem três anos a mais. Em língua portuguesa, um ano e meio a mais”, mensura Machiaverni. “É um investimento que vale. Segundo estudos, 50 pontos do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) resultam em 1% a mais de PIB para o País.”

Outro ponto para a defesa da educação integral pelos especialistas é atender a uma demanda dos próprios estudantes. Em escuta nacional com 2,3 milhões de adolescentes feita pelo Ministério da Educação (MEC), secretarias de Educação e entidades da sociedade civil, como o Itaú Social, a maioria afirmou que deseja ter mais tempo para estudar os componentes curriculares tradicionais, mas também para a prática de atividade física e de projetos mão na massa, que tenham importância para o seu futuro desenvolvimento profissional.

“Quase metade deles não vê a escola como um lugar de aprendizado, e um pouco menos, cerca de 40%, não a veem como um lugar de acolhimento”, cita Guedes. “São quase 10 milhões de jovens, de 15 a 29 anos, que não completaram a educação básica, e quase metade, 40%, não completaram os anos finais do fundamental. Então, a educação integral já pode ser um vetor muito potente de transformação para esses adolescentes.”

Desigualdades a serem superadas

Uma das dificuldades em universalizar a educação integral no País, porém, é a já existente desigualdade socioeconômica brasileira. Os especialistas apontam que a exclusão escolar no Brasil tem cor, raça e condição socioeconômica, e que as políticas de educação integral, se não forem intencionais, podem acentuar essas desigualdades. Isso porque elas tendem a ser implementadas em escolas que já possuem melhor estrutura e professores.

“Há dez anos, foram analisados quatro Estados que tinham bons programas de educação integral. E aí, sem nenhuma intenção de desqualificar, muito pelo contrário, reconhecendo a importância, o que se constatou é que as políticas de educação integral podem acirrar as desigualdades”, afirma a presidente do Cenpec.

Como solução, os especialistas apontam a necessidade do Estado investir nos equipamentos de educação nas regiões de maior vulnerabilidade, além de criar meios para que os professores possam se dedicar a apenas uma escola com ensino integral, deixando de se dividir entre diversos empregos.

A implementação da educação integral é defendida para a quase totalidade dos alunos, incluindo a educação infantil, uma etapa crucial para o desenvolvimento humano, conforme demonstram pesquisas científicas.

“É importante que essa elevação do tempo na educação infantil garanta o explorar, o se movimentar, como está prescrito na Base Nacional Comum Curricular, porque é bem complicado pensar em criança de educação infantil dentro de uma escola, por nove horas, sem espaço adequado para isso.”

Algumas realidades regionais, porém, podem não ser compatíveis com o modelo nessa etapa da educação. “Na Amazônia, em comunidades ribeirinhas de Belém, para uma criança pequena, de 4 a 5 anos, será que faz sentido o modelo de 8 horas, para ela pegar um barco que leva duas horas para ir e voltar?”, questiona Guedes. “É necessária uma adequação para cada território, num país como o nosso, que é tão diverso.”

PROGRAMAÇÃO

O segundo painel do meet point será realizado nesta quinta-feira, 25, às 15h, e discutirá a carreira de professores. O evento online pode ser acompanhado neste link.

Na próxima segunda-feira, 29, das 9h às 16h30, a programação do “Educação em Transformação” terá um ciclo de debates no Museu do Ipiranga, em São Paulo. As vagas são limitadas e é preciso se inscrever pelo site.

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