A ampliação das obrigações das plataformas digitais para combater conteúdos de exploração sexual infantojuvenil na internet, dividindo responsabilidades com os pais e o próprio Governo Federal, é um dos principais avanços do projeto de lei “ECA Digital”, na visão de especialistas.
Mas os educadores fazem uma ressalva: a lei só entrará em vigor um ano após sua aprovação, o que compromete a urgência do tema.

O texto foi aprovado nesta quarta-feira, 20, na Câmara dos Deputados, voltará ao Senado para crivo final.
“O ônus não está apenas sobre as famílias, o que vinha acontecendo até agora. As famílias já sabem que, em algum momento, teremos um alívio parental, ou seja, as big techs também terão suas responsabilidades”, avalia a advogada Catarina Fugulin, líder de políticas públicas do Movimento Desconecta e cofundadora da Plataforma 12.
“O único ponto que eu mudaria é que a lei só vai entrar em vigor um ano após sua aprovação. A infância não pode esperar. Um ano é muito tempo”, sinaliza.
A aprovação foi uma reação ao vídeo do influenciador Felca, que denunciou a adultização de menores e a ação de algoritmos que estimulam a ação de pedófilos nas redes, gerando forte indignação popular.
O influenciador Hytalo Santos, um dos exemplos citados por Felca, foi preso por suspeita de tráfico humano e exploração sexual infantil. A defesa nega irregularidades.
Referência ao Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA Digital traz mecanismos para combater conteúdos de exploração sexual infantojuvenil em ambiente digital, prevendo obrigações para os fornecedores e controle de acesso por parte de pais e responsáveis.
Em linhas gerais, as plataformas devem restringir ao máximo a exposição de menores de idade a conteúdos que envolvam pornografia, violência, assédio e exploração sexual, uso de drogas e jogos de azar.
Uma autoridade nacional autônoma do governo será responsável pela aplicação da lei, criar novas regras e aplicar sanções.
Luciana Temer, presidente do Instituto Liberta, considera importante a retirada imediata de qualquer material de abuso, exploração ou violência contra criança e adolescente que está prevista na nova lei.
“Os sites e plataformas devem retirar o conteúdo e informar a autoridade competente. Isso vai dar agilidade para o processo”, opina a especialista.
O texto estabelece ainda multas de 10% do faturamento ou, quando a empresa não tiver faturamento, o valor pode chegar até R$ 50 milhões.
Entre as medidas aprovadas no projeto está a criação de uma ferramenta de controle parental, que permitirá aos pais e responsáveis gerenciar contas e configurações de privacidade de crianças e adolescentes.
Neste ponto, Luciana Temer faz uma ponderação. “É importante oferecer mecanismos de controle parental, observando o analfabetismo funcional no País. O controle parental tem de ser acompanhado do letramento digital. É importante que a responsabilidade seja dividida com plataformas”.
A advogada Maraisa Cezarino, sócia da Daniel Advogados, especialista em direito digital e proteção de crianças e adolescentes na internet, destaca, entre outros pontos da lei, a exigência de transparência sobre como são feitos recomendações por algoritmos.
Desafios na verificação da idade
O projeto de lei diz que empresas que produzirem conteúdo, produto ou serviço proibido para menores de 18 anos devem adotar medidas eficazes para impedir o acesso de crianças e adolescentes. É proibida autodeclaração do próprio usuário neste caso.
Neste ponto, o advogado Luis Fernando Prado, sócio do escritório Prado Vidigal Advogados e especialista em privacidade e proteção de dados, faz uma ressalva.
“A tecnologia para realizar essa verificação em larga escala, de forma eficaz e sem criar novas vulnerabilidades de privacidade, ainda é um campo em desenvolvimento global”.
“Será importante que a futura regulamentação conte com esforço multissetorial para estudar os padrões aceitáveis, de forma a não inviabilizar a operação de diversos serviços”, completa.