Ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) afirmam que estão em uma sinuca de bico. Nos dias anteriores ao julgamento do governador Cláudio Castro, marcado para a noite desta terça-feira, 4, eles falaram reservadamente do incômodo causado pela decisão da presidente do tribunal, Cármen Lúcia, de agendar o caso para logo depois da megaoperação no Rio de Janeiro sem consultar os colegas.
O processo pronto para julgamento não guarda qualquer relação com a operação policial que resultou em mais de cem mortes. Com provas fartas elencadas na ação, o tribunal teria elementos para cassar o governador e torna-lo inelegível por abusos cometidos na campanha de 2022.

Na visão de integrantes do TSE, fazer isso agora poderia soar como perseguição a um importante aliado de Jair Bolsonaro que tem pretensões eleitorais para 2026. Seria a isca para o ex-presidente reeditar o discurso de 2022 de que o tribunal se instrumentou para impedir a subida de seu grupo político ao poder.
Ministros do TSE acreditam que, às vésperas das eleições majoritárias, seria importante preservar e fortalecer a Corte. Julgar Castro agora vai na direção oposta a esse desejo. Para completar, jogaria o tribunal no centro da disputa política alimentada pelos resultados da operação no Rio.
Mesmo que quisessem cassar o governador agora, ministros afirmam que o processo é complexo. Como não foram previamente avisados que o caso entraria na pauta, eles não teriam tido tempo suficiente para elaborar seus votos em menos de uma semana. Em caráter reservado, dizem que não se pode cassar de forma açodada um governador reeleito em primeiro turno com quase 60% dos votos no estado.
Diante do quadro, o mais provável é que haja pedido de vista. Daí vem a sinuca de bico: se condenar Castro agora soaria como interferência do TSE na crise política do Rio, deixar de julgar um processo pautado poderia ser entendido como uma disposição do tribunal para poupar o governador.
Nesse caso, até mesmo pedir vista seria uma decisão difícil. Nos bastidores, ministros discutem quem poderia fazer isso de modo a reduzir o ônus para a Corte. O TSE é formado por três integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF), dois do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e dois representantes da advocacia.
Ministros ouvidos pelo Estadão consideram que seria menos penoso institucionalmente que a interrupção do julgamento viesse de um dos integrantes do STF. O problema é que, além de Cármen Lúcia, representam o Supremo no TSE André Mendonça e Kassio Nunes Marques – justamente os dois nomeados por Bolsonaro.
Nesse caso, a tarefa sobraria para Antonio Carlos Ferreira, do STJ. A outra representante do STJ é Isabel Gallotti, a relatora do processo, que deixa a Corte até o fim do mês. A expectativa é que o voto dela seja duro pela condenação. Nesse tipo de processo, a ministra tem revelado um perfil rígido. Mas, diante do cenário político, até mesmo ela teria ficado incomodada com a inclusão do processo em pauta agora.
A assessoria de imprensa do TSE garante que a data escolhida para o julgamento não guarda qualquer relação com a operação policial no Rio. Integrantes do tribunal duvidam disso. Para eles, seja qual for o desfecho da sessão de hoje, o TSE sairá enfraquecido.